Engraçado, eu sempre fico pensando em que momento da vida foi criado esse sentimento... a amizade. Quem será que compôs o primeiro par de amigos da face da terra?
Fico imaginando que eles devem ter tido muitas dificuldades nesse relacionamento,
afinal foram os pioneiros em dar carinho, aparar arestas,
serem muitas vezes incompreendidos e ainda assim estarem sempre de braços abertos
para receber o outro quando preciso.
Bom, mas o tempo passou e hoje já sabemos muitas coisas sobre amizade.
Há de ser entender que a amizade não é algo somente que nos traz alegrias
e esse é o maior desafio dela.
Há de se aceitar que se pode ter amigos diferentes de nós, em raça,
religião, temperamento, criação, cultura. Isso na verdade não é importante na amizade.
Há de se saber que as regras principais da amizade são o respeito, a consideração, a tolerância e a humildade.
A consideração é um fator muito importante também.
Não adianta sermos tudo de bom para alguém e
nos momentos mais delicados e necessários para esse alguém,
não termos a consideração que se resume na atenção devida.
Espera-se mesmo que a amizade, como qualquer outro sentimento,
seja uma via de mão dupla. Não existe a possibilidade de só darmos, jamais recebermos e ainda assim sermos realizados nesse sentimento.
Não se trata de um "toma lá dá cá", mas se trata de um "eu me lembro quando eu precisei e você esteve comigo, portanto agora você precisa e eu estou aqui", e isso há de ser feito com um sorriso nos lábios e muito amor no coração.
A tolerância, talvez seja essa a parte principal.
Há de se entender que nenhum ser humano vive em total estado de bom humor a vida toda. Haverão dias que os ânimos não estarão bons, o coração de um deles não estará bem.
Isso sem contar que as pessoas em geral têm os mais diversos tipos
de temperamentos e de atitudes.
Há de se saber que para se ter um amigo,
alguns momentos desagradáveis dele teremos que suportar,
passar por cima mesmo, ignorar, sabendo inclusive que ele em algum instante
fará o mesmo por nós se for amizade verdadeira o que ele sente.
Há de se saber, aceitar e entender, que a perfeição em termos de ser humano não existe, cometemos todos, diversas vezes, falhas, enormes falhas.
Nenhum de nós é o rei da verdade, nenhum de nós está certo o tempo todo ...
em algum momento o nosso amigo é que será a parte certa e
por mais que o nosso orgulho nos impeça de dizer, teremos que aceitar.
A humildade há de precisar estar presente sempre.
Amigos que não convivem com isso, dificilmente conseguirão levar uma amizade avante.
Há de ser ter humildade pra dizer coisas simples:
eu não sei, você me ensina?
Eu não consigo, você me ajuda?
Eu não posso, tenho medo, você vai comigo?
Eu errei, me perdoa?
Eu me arrependi, você me desculpa?
Eu não fui fiel a você, me dá outra chance?
Eu disse o que não devia, você pode esquecer?
Eu ando negligenciando nossa amizade, você me permite recuperar esse tempo perdido?
Ser humilde numa amizade, não significa se humilhar,
significa provar ao outro o seu grau de importância na nossa vida.
Por fim, uma amizade há de ter altos e baixos sim, há de atravessar furacões,
cair em abismos, há de se despedaçar toda ... mas se for amizade de verdade,
há de voltar, envolta em ferimentos, apoiada numa bengala, sangrando até ...
e há de encontrar o seu companheiro com o curativo nas mãos,
amor no coração e disposto a dar o perdão!
Ser amigo, é todos os dias aprender alguma coisa nova, é sempre ter algo de que se arrepender por alguma coisa que se deixou de fazer.
Ser amigo é principalmente dividir uma emoção,
saber acalentar um coração e deixá-lo voar pra longe de nós quando ele precisar.
Mas ser amigo é especialmente se recolher num cantinho e
esperar esse coração voltar pra nossa mão no momento que ele achar que é bom.
Tenho amigos que não sabem o quanto são meus amigos.
Não percebem o amor que lhes devoto e a absoluta necessidade que tenho deles.
A amizade é um sentimento mais nobre do que o amor,
eis que permite que o objeto dela se
divida em outros afetos,
enquanto o amor tem intrínseco o ciúme, que não admite a rivalidade.
E eu poderia suportar, embora não sem dor,
que tivessem morrido todos os meus amores, mas
enlouqueceria se morressem todos os meus amigos!
Até mesmo aqueles que não percebem o quanto
são meus amigos e o quanto minha vida depende de suas existências...
A alguns deles não procuro, basta-me saber que eles existem.
Esta mera condição me
encoraja a seguir em frente pela vida.
Mas, porque não os procuro com assiduidade,
não posso lhes dizer o quanto gosto deles.
Eles não iriam acreditar!
Muitos deles estão lendo esta crônica e não sabem
que estão incluídos na sagrada relação de meus amigos.
Mas é delicioso que eu saiba e sinta que os adoro,
embora não declare e não os procure.
E às vezes, quando os procuro, noto que eles não têm noção
de como me são necessários, de
como são indispensáveis ao meu equilíbrio vital,
porque eles fazem parte do mundo que eu,
Tremulamente construí e se tornaram alicerces
Tremulamente construí e se tornaram alicerces
do meu encanto pela vida.
Se um deles morrer, eu ficarei torto para um lado.
Se todos eles morrerem, eu desabo!
Por isso é que, sem que eles saibam, eu rezo pela vida deles.
E me envergonho, porque essa minha prece é, em síntese, dirigida
ao meu bem estar. Ela é, talvez, fruto do meu egoísmo.
Por vezes, mergulho em pensamentos sobre alguns deles.
Quando viajo e fico diante de
lugares maravilhosos, cai-me alguma lágrima
por não estarem junto de mim,
compartilhando daquele prazer...
Se alguma coisa me consome e me envelhece
é que a roda furiosa da vida não me permite ter
sempre ao meu lado, morando comigo, andando comigo,
falando comigo, vivendo comigo, todos
os meus amigos, e, principalmente
os que só desconfiam ou talvez nunca vão saber que são
meus amigos!
"A gente não faz amigos, reconhece-os".